Pesquisa

segunda-feira, 30 de junho de 2014

"Alonso"

Nas aulas de inglês que aproveitava para frequentar , Francisco tomava contato com pessoas que iam morar em Londres com a idéia de mudarem suas vidas.
Foi numa destas aulas que conheceu Alonso.
Era colombiano mas morava na Espanha antes de decidir vir para Londres.
Ao final da aula Francisco aproximou-se e convidou-o para tomar uma cerveja.
Pensou em ir em um dos pubs que ficam pela volta mas Alonso, logo dizendo que eram muito caros, entrou numa mercearia e comprou duas latinhas.
Francisco, neste momento, não pôde deixar de sentir-se um pouco constrangido, envergonhado mesmo.
Foram então caminhando enquanto bebiam, coisa aliás comum por aqui, à medida que Alonso, que revelou ter cinquenta anos, explicava porque viera para Londres a trabalhar em serviços gerais.
Disse que tinha pensado na educação das filhas de dezesseis e doze anos com quem mora sózinho, separado da mulher, e queria que estudassem inglês.
Por isto, portanto, estava em Londres.
Falou das dificuldades que já enfrentou e disse que há pessoas que tem que viver até com apenas 600 libras por mês e ter que trabalhar, para aumentar este soldo, 12 ou mais horas por dia.
Francisco voltou para casa pensativo.
Entrou e pôs a tocar o concerto n.1 para piano de Brahms.
A música lembrava-lhe o filme "The L-shaped room" , do qual fazia parte da trilha sonora, sobre a história de uma francesa que vai viver em Londres.
No meio destas evocações e desta visão da luta vividas por tantos em tantos lugares do mundo, Francisco percebeu que finalmente tinha escurecido.
Não era seu caso mas se imaginou um dos milhões de trabalhadores que ajudavam a construir e manter esta Babel erigida sobre uma feira de vaidades e o culto do poder e do hedonismo.
Imaginou-se e teve uma forma de desprezo por todos quantos não tinham a sensibilidade de perceber esta luta.
Ao mesmo tempo, por cada um destes trabalhadores, sentiu uma profunda admiração pela coragem em sobreviverem movidos muitas vezes  pela vontade de darem condições aos filhos. 
Assim o mundo se movia montado em engrenagens que permanentemente trituravam ou descartavam as peças miúdas que lhe serviam.
Sem saber Alonso lhe tinha ensinado alguma coisa e enquanto tomavam uma cerveja de latinha tinha sido seu professor.



Um domingo em Brighton (2)

Como disse a respeito, Brighton parece ser uma cidade bem agradável. 
Situada em frente ao mar, na costa sudeste da Inglaterra, antigamente importante centro pesqueiro, tem hoje uma forte presença acadêmica pelas universidades e turística recebendo oito milhões de visitantes anualmente. 
Em especial permite que os londrinos, pela pequena distancia, aproveitem para passar um dia de lazer. 
A presença do mar manifesta-se de forma bem pitoresca pela invasão de gaivotas, na foto no Brighton Pier.

Mas estas gaivotas se encontram por toda a parte, inclusive na zona central terminando por ser um dos elementos bem característicos deste elo. Há outros, como a Brighton Marina e o Fishing Museum, aos quais farei referência noutro momento.
Além do pier é um dos pontos marcantes de Brighton o Royal Pavillion inicialmente construído como residência para o Príncipe Regente, mais tarde Rei Jorge IV, que visitou Brighton pela primeira vez no ano de 1783, por recomendação médica da água do mar para o tratamento de sua gota.

Segundo a história, que compraz aos plebeus ouvir, estando longe da Corte Real, em Londres, o Pavillion era também um local discreto para o Principe gozar a ligação com o sua companheira de longo tempo, Mrs. Maria Anne Fitzherbert. 
O Principe desejara desposá-la, e poderá tê-lo feito secretamente; de qualquer forma isso era ilegal devido à sua Religião Católica. 
Acompanhado por Linda e Konrad chego ao saguão de entrada onde se encontra à venda uma grande variedade de souvenirs. 
Linda procura convencer-me a visitar o Pavillion, pois realmente se trata de uma construção magnífica, mas, num momento de reação ao espírito de turista que me toma conta, resisto, lembro-me da poesia de Brecht "Quem transportava as pedras?" e recuso!

Seguindo meu tour ainda me chama a atenção um estabelecimento que não esconde ser de um brasileiro e que vende produtos diversos do Brasil principalmente derivados do guaraná. Procuro conversar com o proprietário que me diz ter nascido em Brasília mas se encontrar há mais de vinte anos na Inglaterra. 
Fala um português carregado de sotaque e vejo nos seus olhos que seu mundo está distante de suas origens. 
Quando estou saindo, como uma espécie de gentileza, entrega-me um cartão em que consta, "The Guaraná Company Ltda, Boutique, Health Bar & Cafe" terminando com a frase "... with a hint of Brazilian magic..."
Há brasileiros por toda parte na Europa vindos nas últimas décadas para trabalhar , uma verdadeira diáspora, movimento que teria diminuído mais recentemente. 
Hoje o movimento é muito grande mas de turistas brasileiros.
Ou, então, como é o meu caso, de brasileiros que resistem em dar esta impressão.

domingo, 29 de junho de 2014

Um domingo em Brighton (1)



Distante 80 km de Londres , pode-se chegar a Brighton por uma estrada de várias pistas em bem pouco tempo. 
A cidade, com uma população de 160 000 habitantes, é muito agradável mostrando um aspecto menos sisudo, mais claro do que Londres em geral. 
A referência mais conhecida é o Brighton Pier. 
O mar tem um colorido vistoso, que oscila entre o verde e o azul , e entre o pier, a praia e os bares da orla concentra-se na tarde de sol grande número de pessoas.

Já é um dia de verão mas, embora o sol forte, o calor não é muito acentuado. 
Na praia. com piso de pedregulhos, a maioria das pessoas mantém-se vestidas sem roupa de banho e entrar na água, que é fria, ninguém se encoraja.

Conduzido por Linda e Konrad, de quem sou convidado, ela de Wales e ele de Gdanski, percorro a Brighton Marina,  o Fishing Museum, o Royal Pavillon e o centro da cidade.
Antes, no início do passeio, percorremos um boot sale, um tipo de brique ao ar livre onde acabo encontrando uns gatinhos de decoração.
Enfim, acho que começo a perder minha resistência e me sentir mais fraco para opor-me ao fato de tornar-me finalmente turista.






sexta-feira, 27 de junho de 2014

Liberdade de Imprensa existe na Inglaterra?

Uma discussão sempre viva nas sociedades que alegam ou reivindicam liberdade de expressão é até que ponto ela existe ou não.
A Inglaterra, sem dúvida, é muitas vezes apontada como um país no qual esta liberdade seria bem ampla
Pois, justamente, um veículo que é referencia, a BBC, é alvo de críticas por ter divulgado de forma muito superficial a manifestação de milhares de pessoas, ocorrida no sábado dia 21 de junho, no centro de Londres, contra as medidas de austeridade do governo.
Até aí talvez não houvesse nada de novo pois a mídia, mesmo inglesa, acaba favorecendo algumas notícias em detrimento de outras de acordo com critérios que vão depender da sua orientação políticas e vínculos econômicos.
A BBC obviamente não estaria isenta destas influências.
Achei interessante, no entanto, que o programa NewsWatch mantém aberto aos espectadores um espaço para que façam suas críticas ao próprio programa.
E muitas foram feitas relativas à ausência ou superficialidade das notícias do protesto.
O video  dá bem uma idéia da questão.
Acrescentamos, também, parte do teor das críticas.
After reading about a 50,000 person march protesting government austerity measures here, I noticed that someone pointed out in the comments that the bbc hadn't mentioned anything about it. I thought this was pretty surprising, seeing as this was a massive protest, taking place in the middle of london, with speeches from Russell Brand and MP Caroline Lucas, among other people. This is important news, and for a major news organisation to not cover it seems strange.
cWhen I checked this morning (11:30 22/06/14), this was the bbc news home page - no mention of any protests. Same for their politics page, and their England news page. Finally, when I went to local area news for London, there was a tiny link that only had a few lines talking about it, and a short clip with no commentary (screenshotand link).
(Please excuse the quality of these images, they are quick screenshots put together in paint.)
The only conclusion I can draw is that the bbc are deliberately avoiding this story, and have played it off as totally insignificant. Unless you were looking for it, it is very unlikely that a user of their website would ever know this happened, or that it was a major protest.
I've never really had a problem with the bbc before, but for them to avoid reporting this reeks of deception, and makes what I thought was an excellent and mostly impartial news service seem like the propaganda arm of the government.
Thoughts?
Interessante acompanhar os  comentários a respeito assim como ver a notícia por uma outra fonte Business Today, da qual provém a foto que divulgamos.

Bem vindos ao mundo da luz !

O trem subterrâneo, denominado metrô ou ainda, em Londres, underground  ou tube , representa nos grandes aglomerados urbanos, um componente básico da infra-estrutura de transporte.

O underground de Londres soma 249 milhas, ou seja,  400 quilômetros e a viagem inaugural do primeiro trem da linha Central ocorreu em 1900 com a presença de Mark Twain.
É um mundo próprio com suas histórias alegres mas algumas certamente tristes.
Segundo levantamento 50 pessoas se suicidam por ano no Underground.

Em alguns casos o que impressiona é a profundidade das linhas que pode chegar até o máximo de 59 metros na estação de Hampstead da Northern Line.

Não admira, portanto, que descer do trem e aproximar-se da saída subindo as escadas represente, em alguns momentos, como voltar de uma viagem ao centro da terra.

E a visão do que nos espera lá fora sempre me chama a atenção.
Gosto, particularmente, da saída em Charing Cross na qual a visão da rua vai surgindo à medida que se sobe a escada. tendo a torre de St-Martin-in-the-Fields bem à  frente como a dizer, viajantes das profundezas, bem vindos ao mundo da luz !


The sky in Colliers Wood (2)


The sky in Colliers Wood


terça-feira, 24 de junho de 2014

De volta a Covent Garden

Francisco tinha decidido ir até Covent Garden.
Era um outro item das visitas a lugares que queria rever.
Lembrava que costumava ir lá mas já não sabia bem o motivo.
Seria pelo movimento?
Naquela ocasião seus interesses talvez fossem outros, interesses que hoje possivelmente já não tinha.
Sua idéia inicialmente foi de ir pela manhã mas atrasou-se e acabou saindo só depois do meio-dia.
Fazia calor, Francisco andou algumas quadras e mudou de idéia.
Decidiu ir depois da reunião de inglês.
Já era, portanto, seis e meia quando dirigiu-se para Covent Garden.
Aproveitaria para pegar o movimento de fim do dia do centro em Londres e evitaria o calor.
Tomou o metro em Colliers Wood e fez, como de costume, a transposição em Kennington para ir até Leicester Square.
Chegou a pensar em descer em Charing Cross e dali seguir caminhando até Leicester Square.
Mas decidiu encurtar o trecho que faria a pé.
Desceu, pois, em Leicester Square junto a Charing Cross Road , rua ao longo da qual sucediam-se livrarias. Entre elas, no entanto, já não existia a do número 84 da qual ainda procurara, outro dia, encontrar vestígios.
Dali caminharia um pequeno trecho para chegar em Covent Garden.
Nas ruas uma multidão agitava-se movida por interesses que pareciam os mais diversos e inumeráveis mas que, ao fim, talvez se reduzissem a um número bem restrito. Encerrar as atividades diárias, talvez dedicar uns minutos a reunir-se com amigos num dos inumeráveis pubs que se concentram nos arredores ou simplesmente retornar para casa o mais cedo possível.
Numa esquina viu num pub uma bandeira brasileira bem à vista.
Aliás, a julgar pela quantidade de coisas que se encontra referentes ao Brasil por motivo da Copa, poderia pensar que não tinha saído do país.
Continuou caminhando e ainda precisou pegar uma informação na esquina da Covent Garden Station mas já estava chegando.
Percorreu os últimos metros e finalmente, depois de tanto anos, lá estava Covent Garden Market diante de seus olhos.
Parecia mais  repleto de comércio, de lojas, bem parecido com um shopping.
E foi esta a sensação que foi se reforçando à medida que percorria o interior a ponto de se perguntar, o que estou fazendo aqui?
Era o mesmo lugar, talvez até nem tivesse mudado tanto, Francisco é que poderia ter mudado.
Depois de caminhar um tempo, decidiu conferir se os sanitários, pois precisou de um, mantinham-se os mesmos.
Tinha uma lembrança disto, ficavam no subsolo, numa área lateral , mas fora do mercado.
E efetivamente lá estavam.
Finalmente algo que conferia com a lembrança que tinha!
Talvez porque , na ocasião anterior e nesta, a necessidade fosse a mesma.
Depois ainda ficou perambulando um pouco no meio do povo que ocupava o Mercado.
Numa parte do subsolo abrigando um restaurante ocorria um concerto.
Um grupo executava música clássica e , no mesmo instante, seu sentimento em relação ao ambiente se tornou mais positivo.
A seguir uma cantora, presumo que Fabienne Borget pois havia cartões em alguns lugares,  interpretou uma ária da La Bohème de Puccini, pareceu-lhe Quando m'en vo' soletta
É o que estava faltando para enternecer-se. 
Sentiu-se comovido tanto pelas lembranças que evocava quanto pela cantora, que enchendo o amplo espaço aberto do local com sua voz de intérprete lírica, conseguia sobressair-se ao ambiente comercial predominante. 
Mas queria voltar.
A não ser pela emoção do concerto e pela reminiscência dos toilets  não encontrava nada que pudesse, naquele momento, representar algum tipo de referência e prendê-lo ao local.
Retomou, portanto, o caminho de retorno.
Antes de chegar à estação de Leicester uma chuva.
Inicialmente fraca, uma leve chuva de verão em Londres, depois mais forte.
Correu e chegando à estação incorporou-se à multidão que pensara não encontrar mais naquele horário, já depois das oito.
Mas nenhum sobressalto, até aquele momento tinha do metro de Londres uma experiência extremamente positiva.
Quando entrou no trem e ele partiu precisava apenas deixar seu corpo ser levado enquanto sua mente buscava reencontrar-se com suas referencias.
O metro exercia sobre ele tipos diferentes de reação.
De um lado uma quase repulsa por uma certa sordidez do ser humano ter que se movimentar dentro de túneis escavados a muitos metros de profundidade numa espécie de mina, todos os dias, normalmente quase uma vida inteira, para ir de um lugar para outro, especialmente para os locais de trabalho.
Mas, por outro, um tipo de fascínio por entranhar-se num mundo onde o ser humano encontrava-se tão exposto, tão frágil quase, numa condição de ser subjugado a cumprir um ritual de sobrevivência.

-Waterloo !
Era o nome da segunda estação, já tinham passado por Charing Cross, que pelo alto-falante anunciavam.
Francisco naquele momento lembrou-se de sua mãe, do que comentava sobre o filme Waterloo Bridge , ao qual ela se referia como A Ponte de Waterlô, com Vivien Leigh, e Robert Taylor e gostava de cantarolar a canção.

A viagem prosseguiu.
Algumas pessoas simplesmente deixavam-se ficar, como anestesiadas, aguardando o momento de descer. 
E sempre encontrava-se quem procurasse ler. 
Um livro, o jornal London Evening Standard  , de muito boa qualidade, que era distribuido gratuitamente na entrada das estações.
Outro dia deparou-se com uma moça que lia Kafka. Não conseguiu perceber qual o título e teve uma vontade enorme de interpelá-la mas estava um pouco distante e não se sentiu à vontade para tentar.
Outros passageiros pareciam dormir.
Mas de fato não dormiam ou se dormiam, não perdiam a consciência de onde tinham que descer.
Aliás nunca sabia nestes casos se as pessoas estavam adormecidas ou meditavam.
Em alguns momentos pareciam meditar.
Ou talvez as duas duas coisas ao mesmo tempo.

- Kennington !
Era aqui que tinha que descer para fazer a baldeação para Colliers!
Desceu e atravessou os metros que separavam do outro trilho.
Mas uma multidão desceu também.
Um grupo de japoneses ainda ficou dentro do trem sem perceber que a linha terminava ali.
Quando o trem seguinte chegou já vinha lotado.
Não queria ir em pé, decidiu aguardar o seguinte.
Em menos de cinco minutos já estava chegando e, desta vez, pode encontrar um lugar sentado.
Olhando em volta sempre encontrava pessoas que liam, dormiam ou conversavam quando não se encontravam sozinhas.
Ou talvez, de olhos fechados, meditassem como parecia por vezes.
Ainda não tinha visto ninguém falando sozinho.
Lembrou-se que sua sobrinha, com sua coragem e sua determinação, fazia aquele trajeto todos os dias, como uma autêntica inglesa, de saia, meias pretas e sapatilhas ballerine também pretas.

-Stockwell !

Este trecho final da linha para Merton já era rotina.
Clapham North , Clapham Commom e Clapham South sucederam-se como um trio.
Lembravam-lhe a Santíssima Trindade e era com certo alívio que via o trem chegar na seguinte

- Balham !
Isto indicava que faltava apenas passar pelo duo de Tooting, Tooting Bec e Tooting Broadway, para finalmente chegar a Colliers Wood.

- Tooting Bec!
O trem arrancou e, fechando os olhos, ouvia embalado pelo sacolejar dos vagões, um som que era uma mistura de um ronco que lembrava um furacão bem próximo com os estalidos e entrechoques de massas de aço
                                                      - Tooting Broadvay !
                                                                                                     Pôs a mão na måquina fotográfica e na mochila para tê-las bem seguras e preparou-se para descer. 
Colliers era a próxima parada. 
Qualquer dia talvez se dispusesse em ir até Merton, a última estação.
Tinha um misto de curiosidade e fascínio pelas estações de fim da linha.
Quando anunciou-se Colliers desceu, adentrou no corredor central e subindo a escada rolante, chegou no saguão. Ali sempre corria um vento forte.
Passou o Oyster pela cancela e saiu.
Lá fora, na esquina com a Merton High Street, depara-se com o vulto negro do "Colliers Wood Tower" que está incluído entre os edifícios mais feios de Londres e que assombra, com sua desproporção, tudo que o rodeia a uma larga distância.
Ainda teria que passar no mercadinho para comprar mantimentos.
No apartamento os gatos o esperavam, talvez exceto Homer que saía a passear e não tinha hora para voltar.
Estava em Londres mas Francisco tinha a sensação de que era como estar em qualquer lugar do mundo.
E, ao mesmo tempo, de que estaria preparado para ir aonde quisesse, de que poderia dentro do tube adormecer e ultrapassando a estação de Merton acordar num lugar imprevisível bem distante de tudo.


English Conversation Class



Minha segunda aula de inglês na Donald Hope Library.
Aula, como diz o convite , cuja finalidade é "improve your conversation for non-English speakers". 
E acrescenta:"Drop-in session". 
Eu gosto muito do termo "drop-in".É literalmente o que acontece. 
Na aula desta segunda não encontrei os mesmos alunos da aula anterior.
Mas a atividade continuou, sob a coordenação da Professora Jacqui Lunganga, que é de Gana, sem que isto tivesse muita influência.
Um assunto que é retomado é a Copa do Mundo. 
No grupo pessoas de vários países. Espanha, Itália, Irã e outros. 
Na semana anterior lembro-me de Equador, Argélia, Espanha e França. 
Chamou-me muito a atenção que a moça da Espanha revelou que estava numa casa com 10 pessoas todas espanholas. 
Na distribuição dos quartos ela ficava com mais duas ou três moças e ressaltou o detalhe que tinha janela. 
Todos acharam graça mas percebi quão realmente era importante.
Por enquanto sou o único a representar o Brasil e me esforço, já que a maioria que participa trabalha ou procura emprego em Londres, para parecer que não sou turista. 
Mas está difícil de acreditarem.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Terceiro Dia

Animado pelos meus progressos na cozinha decidi ousar. 
Fui  até o supermercado mais próximo e procurei ingredientes para um prato mais sofisticado. 
É incrível o que se pode encontrar por aqui.
Bem, o resultado está aí, moquequinha de corpinho de siri. 
Fiz tudo sózinho, sem o auxílio de meus amigos que no prato anterior me deram muitos conselhos e sugestões e sem mesmo a interferência de Homer.
Prá variar não tomei vinho.
Preferi uma cerveja bem gelada.

domingo, 22 de junho de 2014

Segundo Dia

A receptividade e a  indulgência de amigos e amigas  à minha manifestação de disposição de cozinhar  deixou-me comovido.
Confesso que fui um pouco dramático quando disse que me arriscaria na cozinha e, se não desse notícias, seria porque algo teria dado errado.
Mas depois de quase dois meses afastado da comida caseira, o corpo e a alma começam a reclamar.
A opção, neste momento, passa a ser fazer as próprias refeições, pelo menos algumas.
Dizendo assim parece simples até o momento em que, como numa alquimia, deve-se partir para reunir os elementos e combiná-los na proporção certa, durante o tempo certo, a fogo baixo ou fogo alto, com mais ou menos água, com este ou aquele tempero, enfim, até o momento em que se deve reunir um mínimo de teoria com uma dose básica de prática.
Para o filósofo grego Empédocles a estrutura do mundo consistia da combinação de quatro elementos essenciais, Fogo, Ar, Água e Terra que ele chamava ainda de “raízes” e identificava com os deuses Zeus, Hera, Nestis e Aidoneu. 
Para Empédocles de acordo com as diferentes proporções em que os quatros elementos fossem combinados , resultariam as diferentes estruturas.
Pois bem, esta a tarefa a que me impus, terrena mas, também, com um fundamento filosófico.
No caso de preparar um prato de arroz, os Quatro Elementos , Terra, Ar, Água e Fogo estão bem distinguidos, sendo a Terra o próprio arroz.
Esclareço que não cheguei a pedir para que rezassem por mim porque isto introduziria um elemento místico ou religioso não de todo conforme às minhas convicções.
Mas se alguns amigos rezaram agradeço por isto.

Bem, o resultado da primeira tentativa já revelei e é o que podem ver ao lado
Desisti do arroz pois me pareceu que já exigia alguns conhecimentos avançados, especialmente em se tratando de uma variedade , de grão bem miudinho, da qual tenho poucas informações.
Pensei ser asiático e só Deus poderia saber como se comportaria no cozimento.
Por isto optei pela massa.
Segui algumas orientações de Oliver, o gato mais caseiro na face da terra, que nunca se afastou do meu lado.
Depois de tomar meia garrafa de vinho ficou razoável . 
Quero dizer, pelo menos, não parecia comida empacotada nem comida inglesa. 
Podia ser pior que ambas. mas era diferente.
É claro que muito menos era brasileira mas, pelo menos, tinha sido feita por um brasileiro.

Mas volto a dizer que me comoveu o apoio dos amigos e amigas. 
Foram muitas as sugestões, desde o tipo de vinho,  a escolha de outra bebida pois surgiu a idéia de que tinha leite na mesa ( de fato uma vela ) até a lembrança de consultar o google.
Devo, contudo, reiterar que o maior apoio partiu de Oliver.
Ficou o tempo todo ao meu lado me dando a sensação de que confiava que eu pudesse produzir um prato em condições dele próprio saborear.

De ontem para hoje, no entanto, achei que tinha assimilado alguns conhecimentos, enchi-me de coragem e parti para fazer o arroz
Só vou comentar que me surpreendeu e aprovei.
Até o visual, que podem acompanhar pela foto, evoluiu.
Já proponho-me, inclusive, a elaborar algumas regras, talvez um Manual de Sobrevivência na Cozinha Moderna
Duas já me ocorrem agora.
Diria que há dois tipos fundamentais de sobreviventes. 
De um lado, os que enfrentam situações extremas desprovidos das condições mínimas para se manterem vivos. 
Seria o caso dos náufragos, por exemplo.
E, de outro, pessoas que ficam sozinhas numa casa e embora tendo todos os recursos possíveis tem a sensação de que poderiam morrer de inanição.
Outra regra.
Há alimentos que se ultrapassarem o tempo recomendado no micro-ondas ainda assim podem ficar minimamente comestíveis.
Outros não.

sábado, 21 de junho de 2014

Portobello Road


Portobello Road , aos såbados, é considerado visita obrigatória em Londres, principalmente para os turistas.
Pois bem, decidi ser bem comportado e estive presente.
Sempre se encontra algumas coisas de interesse e também se acaba cedendo à fraqueza, ou dependendo até à necessidade, de comprar alguma coisa mesmo que apenas um souvenir.
A seguir vou repassando alguns registros ( "dever de casa").
Mas só depois eu soube, que ao mesmo tempo, no centro de Londres, houve uma marcha de protesto, com milhares de participantes, contra as medidas de austeridade.

sexta-feira, 20 de junho de 2014

"Les Quatre Vents"


Com o passar dos dias vão se acumulando experiências, lembranças, sentimentos, tantos e tantas que se houvesse controle deste tipo de bagagem não passaria na aduana.
Neste roteiro o relato destas experiências irá se entremeando sem uma lógica cronológica.
Volto, portanto, a Brest onde, graças aos amigos Anne e Jean-Michel, pude conhecer em detalhes a riqueza marítimo-cultural e natural da cidade e deste recanto da Bretanha.
E um registro especial faço ao bar "Les Quatre Vents" que consegue propiciar, num ambiente muito especial e particular, todo ele evocativo de temas náuticos, que se aprecie todos estes aspectos, sentado à uma mesa sorvendo lentamente um aperitivo. Foi um dos primeiros recantos que meus amigos levaram-me a conhecer. E, antes de partir, pedi para voltar para trazer do local uma lembrança mais indelével.

Le Chat de Douarnenez

Não saberia dizer hoje qual será  a sorte deste pequeno gato de madeira.
Nossos destinos se cruzaram, por um momento, em Douarnenez.
Tive-o em minhas mãos, poderia ter saído com ele do broquant onde o encontrei.
Mas adiei a decisão e tive que deixá-lo para trás.
Alimento, no entanto, a esperança, com a ajuda de pessoas que possam interferir, de que nos reencontraremos.
Há algo em sua existência que me perturba e continuará a me perturbar enquanto não puder, de novo, tê-lo comigo e tentar entender a origem e a natureza deste mistério.
Do contrário, restará indecifrável para sempre.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

84 Charing Cross Road



 He Wishes For The Cloths Of Heaven

HAD I the heavens' embroidered cloths
Enwrought with golden and silver light
The blue and the dim and the dark cloths
Of night and light and the half-light
I would spread the cloths under your feet
But I, being poor, have only my dreams
I have spread my dreams under your feet
Tread softly because you tread on my dreams

William Butler Yeats

( aguarde a sequência )

terça-feira, 17 de junho de 2014

Le Rouge et le Noir


Donald Hope Library



Como tenho observado ser usual em vários países as bibliotecas, em muitos casos mantidas pelo governo, constituem-se em núcleos de atividades educativas e culturais.
A Donald Hope Library , em Colliers Wood,é um exemplo disto. 
Aproveito para rever meus conhecimentos de inglês e francês o que é oferecido gratuitamente em "drop-in sessions", ou seja, em sessões abertas a qualquer um que decida aparecer. 
Foi o que eu fiz, hoje, para a aula de francês. 
A aula já estava em andamento e nunca tinha, evidentemente, visto o grupo participante.
 Mas, em questão de segundos, estava integrado como se o conhecesse há mais tempo num clima descontraído muito bem conduzido pela professora Catherine. 
Lástima que não tenha muito tempo, do contrário ia começar a estudar chinês



segunda-feira, 16 de junho de 2014

Taste of Brazil

Chega um momento nas viagens , quando elas se estendem um pouco mais, em que o que deixamos distante em nossa casa e em nosso país, começa a ser uma lembrança mais forte.
Seria o que gostamos de dizer que apenas uma palavra, existente só na língua portuguesa, é capaz de expressar. 
Saudade.
É quando tudo que  nos traga lembranças passa a ter um significado mais forte.
Neste momento acabamos abrindo mão da determinação de viver tão próximo quanto possível de tudo que tenha a ver com a cultura do país que visitamos e fraquejamos.
A vontade de falar português, comer arroz e feijão e, para os gaúchos, um bom assado e tomar chimarrão, fala mais alto.
Tomar caipirinha também, mas neste pub, com o sofisticado nome Hung-drawn & Quartered na Great Tower Street e com a libra a 3,80, é melhor esperar para matar a saudade.
Há bares brasileiros  em Londres nos quais 
a caipirinha é autêntica e o preço não é inglês.


sexta-feira, 13 de junho de 2014

Um Jardim em Esch


No convívio, muito rico, que no decorrer da viagem tem sido possível manter com amigos que me acolheram em Brest, Drachten e Koln (Esch)
, muitos foram os momentos que pretendo, aos poucos, registrar no Roteiro de uma Viagem Improvável.
Um deles foi conhecer o jardim de Martina em Esch , no qual , numa mesa ao ar livre, no fim das tardes entrando o anoitecer e provando especiarias germânicas,  joguei xadrez com Joachim tomando cerveja Kolsch.
O jardim ocupa um terreno bem amplo no fundo da casa em Esch nas imediações de Koln e abriga, além das flores e plantas cultivadas por Martina, uma coleção de cactus de Joachim, duas tartarugas num laguinho e, vizinho a ele, em outro laguinho, uma família de sapos. São sapos grandes que dão a impressão, quando se manifestam com sons parecidos aos da voz humana, de estarem falando conosco. Mas seja o que for que possam estar dizendo, ou querendo dizer, um dos vizinhos à noite, segundo me disse Joachim, não está muito interessado em ouvir.




quinta-feira, 12 de junho de 2014

Jardins e Parques Londrinos: lembranças de Blow-up



Um dos aspectos atraentes de Londres , em sendo uma metrópole  , são os jardins e parques. De todos os tipos incluindo tanto os maiores , criados e mantidos pelas administrações, quanto muitos outros, menores, alguns mantidos pelas comunidades e também voluntários. 
Nunca me sai da lembrança no filme Blow-up de Antonioni a cena  no parque que captada por acaso num foto irá depois , quando ampliada, revelar um crime. O enredo do filme é baseado num conto de Julio Cortazar, "Las Babas del Diablo"
O local da cena  é Maryon Park um pouco longe daqui.
Por enquanto limito-me a passear por Wandle Park , do qual são as fotos, e Merton Abbey Mills , ambos em Colliers Wood.



segunda-feira, 9 de junho de 2014

A Batalha de Amsterdam ( II )



Um dos aspectos que mais chamam a atenção com relação ao ciclismo na Holanda  é a participação intensa não só de adultos mas, igualmente, de idosos e crianças.
Não me surpreendeu, portanto, deparar-me na Hobbematstraat com uma senhora que procurava um pouco atrapalhada resolver alguma coisa na sua bicicleta.
Enquanto isto o motorista de um carro luxuoso, como existem muitos, aguardava o momento de avançar. 
Quando a mulher aproximou-se pude perceber que tinha dificuldades e, além disto, não se dava conta de estar bem no meio da faixa dos ciclistas arriscando-se a ser atropelada pelos próprios ciclistas.
Dirigi-me a ela e relatou-me que a sacola que levava sobre o bagageiro, segundo  disse encomendada recentemente,  devia estar prejudicando o movimento da roda traseira.
Ficamos procurando descobrir se realmente esta era a causa até que ela própria percebeu que um dos raios da roda estava solto e interferia no movimento. 
Demos uma volta no raio solto em torno de um outro fixo e, pronto, a bicicleta poderia pelo menos levar sua condutora ao seu destino.
Num dado momento da conversa perguntei-lhe se gostava de usar a bicicleta.
Confesso que andei o tempo todo tentando encontrar algum traidor, que me dissesse que odiava ou, pelo menos, que não gostasse.
Sua resposta, no entanto, me deixou sem ação. 
Desviou por um instante sua atenção da tarefa de resolver o problema com a roda e fixou-me o olhar.
- Se gosto?, iniciou respondendo e, em seguida, concluiu:
- Eu pedalei toda a minha a vida!, afirmou categoricamente..
Diante desta resposta eu não tinha mais o que dizer.
Apenas curvar-me, naquele momento, à força de algo que estava acima de minha capacidade de poder influir.
Fiquei, portanto, depois de nos despedirrmos, apenas vendo-a desaparecer, caminhando lentamente a carregar a bicicleta, curiosamente num sentido contrário ao que imaginei que vinha tomando, pela 
Hobbematstraat em direção ao Museu Rijks 
Fui seguindo-a com o olhar até onde era possível distinguí-la em meio a outras pessoas que foram aparecendo e ainda pude perceber , finalmente, que subia na bicicleta e desaparecia pedalando.



De Amsterdam a Koln


Uma parte da viagem, da Viagem Improvável, quase a metade, vai ficando para trás.
A parte mais sujeita a imprevistos, a situações que pudessem fugir do controle, que pudessem dar sobressaltos como em algum ou outro momento chegou a suceder.
Lisboa, a primeira estada em Londres, Paris, Brest, Douarnenez , Quimper, Rotterdam, Drachten e Amsterdam estão vencidas.
A caminho de Koln, saindo de Amsterdam com baldeação em Utrecht, restam poucos dias, até segunda, para estar de volta a Londres.
Em Londres, até 18 de julho, estou em “casa”.

Neste momento olho pela janela à espera de algum sinal que indique que o trem entrou na Alemanha.
Ainda hà pouco o fiscal passou pedindo a passagem. Pediu-me também o passaporte.
Duas horas até Koln.

Pela janela vejo, assim que se sai da estação de Utrecht, muita mata e áreas verdes, em parte com plantio.

O trem chega à uma estação, Arnhem, acho que vai ir passando por várias no caminho
Pára por alguns minutos e retoma seu trajeto atravessando uma parte da cidade que reproduz o mesmo modelo de construções que se encontra em toda a Holanda.
Prédios de tijolos à vista, telhados altos, raramente um terraço e frequentemente águas furtadas.
Como a grande maioria das casas simplesmente repetem um mesmo modelo, reproduzido infinitamente, não há como deixar de ter a idéia de um enorme conjunto habitacional.

                                                                                   Abro um parêntese.
Neste momento o trem vai passando ao lado de uma via, praticamente uma estrada, bem larga , com ciclistas transitando.
Tudo leva a supor que estão percorrendo distâncias bem grandes pois já estamos em uma zona pouco urbanizada.
E me faz supor, sem dúvida, que ainda estou na Holanda.
Alguém na condição de porta-voz do trem anuncia que o trem se retardará alguns minutos ( creio que disse oito) à espera da passagem de uma outra composição.
Isto não parece perturbar ninguém.
É um dia muito agradável, o sol entra pela janela ao meu lado.
O vagão tem vários lugares vazios e em alguma poltrona mais à frente um dos passageiros ressona dormindo.

Acabamos de passar por Wesel.
O trem não pára, nunca vou saber se por não ser previsto ou por não ter passageiros para subir ou descer, e começa a acelerar.
Sempre é surpreendente a velocidade que podem alcançar.
Nada anuncia ainda que tenhamos entrado na Alemanha.
Fico em dúvida, procurando uma sinalização , uma inscrição em alemão
Passamos por uma usina  que lembra Candiota pelo porte da chaminé de exaustão.
Finalmente a arquitetura começa a dar sinais de que se modifica um pouco , mais casas pintadas, uma ou outra de brando ou amarelo
Estamos na Alemanha!